Medo do Tempo


O tempo estava definitivamente bravo, sombrio, intercalando entre escuro e o claro dos raios de trajetórias sinuosas e ramificações irregulares, causando relâmpagos que rasgavam de ponta a ponta o céu sem estrelas, gritando sagaz três ou quatro segundos após o clarão. O vento se fortalecia, se jogando contra muros e troncos, arrancando flores, movimentando o mar. JuAna havia fechado o café mais cedo por conta do temporal, desde criança tinha medo de trovões, eles a faziam se encolher e fazer careta debaixo da pia de seu estabelecimento, com a cabeça apoiada entre os joelhos.
Na infância amava a chuva, o barulho que vinha com ela, os clarões, a intensidade da água escorrendo por entre os sulcos. A menina JuAna não tinha medo de nada. Escondida de sua mãe ela corria em volta do casarão, mãos postas para o céu, a boca aberta bebendo os pingos de chuva que caiam incessantemente. A JuAna adulta esquecera da Juana menina que amava a chuva e o medo gostoso que vinha junto dela. Essas lembranças foram ofuscadas por clarões, freios, trovões e batida. A menina que esperava o pai para a ceia, a menina que escondia uma moldura feita de troncos embrulhada em papel machê atrás das cortinas, a menina que esperava com ansiedade compartilhar a chuva, o tempo, o peru com seu herói, com seu exemplo, essa menina morreu ao fim da chuva. Quando tudo parece sereno, quando o mundo parecia lavado de todo o mal, alguém bate na porta com um ridículo: Sinto muito! A infância feliz é apagada como um borrão desnecessário, em seu lugar uma mulher sem sonhos com medo do tempo.

[Poliana Fonteles]
Fonte: Minhas Ana's

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